No mesmo encontro com a cantora/compositora Xandreli (veja a postagem #10 do blog), tive a oportunidade de conhecer o seresteiro Vicente Lopes Ramos para aprender sobre a Seresta. No encontro anterior, o Wander tinha me falado sobre as diferenças entre a Seresta e a Serenata – ambas são essencialmente a mesma coisa, mas indicam raízes musicais ligeiramente diferentes.
Enquanto “Serenata” é um termo amplamente usado para fazer referência a canções (ou uma cantata), a ‘Seresta’ retrata uma identidade única do Brasil, pois herdou elementos musicais das culturas europeia e africana. Considerando a importância de Diamantina como uma cidade de mineração diamantífera durante o período colonial, não é de se admirar que tal gênero musical tenha se desenvolvido.
Então, como foi que a Seresta tornou-se um gênero musical popular em Diamantina?
Segundo o Wander, os primórdios remontam ao final do século XVIII, quando se importavam pianos da Europa para os lares diamantinenses. Como Diamantina era uma cidade rica e de muitos recursos e mantinha estreita ligação com o Rio de Janeiro, ter um piano em casa não era uma coisa rara. Em casa, cantavam-se modinhas. Contudo, ter um piano não era um luxo acessível a todo mundo. Portanto, a música foi gradativamente sendo levada para as ruas para que pudesse ser compartilhada de forma mais ampla.
Assim como o sarau tornou-se um evento compartilhado entre as pessoas comuns, o mesmo aconteceu com a música que representava a demografia de Diamantina. O Fandango e o Lundu, que são dois elementos musicais da música de dança africana, foram incorporados à Modinha. Dessa fusão, nasceu a Seresta.
Embora o termo ‘Seresta’ tenha se perdido um pouco antes da década de 1970, foi novamente retomado por um dos expoentes dessa tradição, o ex-presidente Juscelino Kubitschek. O próprio Kubitschek participava das serestas e uma vez disse: “Uma serenata em Diamantina é mais bela do que uma noite de trovadores em Nápoles”.
Com base nesse contexto histórico, eu quis saber: como a seresta repercute na população diamantinense hoje?
Vicente, que é cantor e compositor de serestas, já compôs mais de 200 músicas. Ele me disse que os temas dessas músicas vão desde o romântico até as belezas da cidade. A estrutura dessas canções normalmente se baseia em uma linha melódica simples com acompanhamento instrumental. Os instrumentos mais comuns incluem (mas não se limitam a): cavaquinho, violão, pandeiro, flauta, clarineta e acordeão.
Depois de se apresentar, o Vicente executou para nós, de forma especial, a sua música “Acorda, Chica”. Chica da Silva foi uma figura importante em Diamantina durante o século XVIII, que saiu da escravidão e defendeu a democracia social.
Depois de ouvir o Vicente, lembrei-me da popular canção de seresta “Oh Minas Gerais / Peixe Vivo” que eu gravei em Londres no mês de março (essa filmagem foi feita para fazer parte da Vesperata em abril, mas o evento foi adiado devido às restrições por causa da pandemia). “Oh Minas Gerais / Peixe Vivo” é uma música já cantada na Vesperata.
Com melodias simples e bonitas que contam a história da terra natal, essas músicas podem ser facilmente cantadas e compartilhadas por todos (como se pode ver no vídeo abaixo). Ao ver as várias filmagens da Vesperata com a multidão imersa nessa música, fica claro que a Seresta ainda hoje é um veículo importante para aproximar as pessoas. Fico ansiosamente aguardando para participar da seresta na Vesperata (data a ser anunciada!)